A ARTE COMO EXERCÍCIO
LUCAS BENATTI
Lucas Quintas exerce sob sua arte uma conexão racional e matemática. Suas obras materializam um processo conceitual e consciente, como um exercício próprio da abstração mental. Existe uma ligação entre o pensar e o propor, que aproxima seu trabalho das primeiras referências à arte conceitual e minimalista da década de 1960, além de uma evidente apropriação temporal – e seu interesse pela percepção do espectador – na seriação de suas obras. O artista consegue manter uma potência singular, e ao mesmo tempo coletiva, ao trabalhar com séries, uma vez que o espectador é atravessado tanto pela unidade, quanto pela universalidade dos trabalhos.
Para além de um procedimento poético, a possibilidade de existência una e múltipla da obra convergem (formalmente) para os jogos perceptivos que Lucas Quintas imprime em seu trabalho. A todo instante o artista nos instiga a olhar novamente para suas produções, requisitando, do espectador, uma postura ativa. Sua arte desguarnece o olhar, favorecendo sua desnaturalização. Exprimindo uma poética de princípio racional, a arte de Lucas Quintas também busca trazer à consciência os afetos estéticos, é um alerta para nossa iminente ilusão diante das obras.
Sua série “Câmbios” é justamente uma advertência ao juízo da percepção e ao risco da ilusão do olhar. Algo sempre muda, é sempre diferente, é sempre outro. Algo sempre se transforma diante de nós, sem deixar de ser o que já foi. O artista nos leva novamente à uma vigilância da percepção e da ilusão: pois não é possível percebermos que estamos diante de uma ilusão, ao perceber uma ilusão, ela já deixou de ser. Ao percebermos uma cor, uma forma, uma linha... ela já deixou de ser para tornar-se uma outra cor, uma outra forma, uma outra linha.
O pensamento racional de Lucas Quintas também manifesta-se na lógica científica aplicada em suas obras. É como um exercício de física ou matemática: as forças de equilíbrio, o volume das formas, o peso, a direção, a extensão, a velocidade. Suas séries “distensão” e “tensão” são bons exemplos de como esses princípios são levados a contingência estética, linhas são esticadas, pesos são dispostos em extremidades antagônicas. O artista parece querer colocar à prova, constantemente, os materiais que utiliza.
Lucas Quintas dialoga constantemente com essas regras que objetivam a arte para, ao mesmo tempo, criar situações sensíveis. Sua série “embate” sintetiza essa relação entre/dos corpos, dando uma sobrevida aos objetos. O pedaço de madeira que é perfurado pelo prego, que afere a resistência de seu corpo que, simultaneamente, também passa a fazer parte deste corpo. O pedaço velho de mangueira que enlaça a rocha e a domina, colocando em conflito a resistência e a flexibilidade dos materiais. Seu trabalho nos faz pensar sobre os limites, e quais os limites para composição de uma obra? Qual o limite de resistência de um corpo? Quais os limites de tensão entre os objetos e o espaço?